sexta-feira, 24 de julho de 2009

‘ESTAMOS CAMINHADO PARA VIRAR A PÁGINA"


Marco Antonio Villa, entrevista a O Globo


Para historiador, crise do Senado é produtiva por representar ‘morte política de Sarney’ e da ‘maioria comprada’A crise que envolve o Senado e atinge em cheio o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), tem um lado “muito positivo” e “produtivo” para o historiador Marco Antonio Villa, professor do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).


Segundo ele, Sarney é o “símbolo maior” do coronelismo no país, e a crise pode provocar sua morte política, com uma mudança positiva para a democracia brasileira.— Sarney é o símbolo maior desse poder dos coronéis. Por isso esta crise é extremamente saudável.


Estamos caminhando para virar a página — afirma Villa, que acusa senadores de se venderem para compor a maioria do governo: — São comprados.


Adauri Antunes Barbosa SÃO PAULOO


GLOBO: Sarney tem razão ao alegar que a crise só existe por ele ser aliado do governo?


MARCO ANTONIO VILLA: É verdade, não é só o Sarney.


O Senado teve outros presidentes e Mesas compostas por vários senadores. Quer dizer, a crise é do Senado. Mas não é só do Senado. É do Senado e do Sarney.Afinal, ele já tinha sido duas vezes presidente do Senado.


As denúncias contra Sarney já são conhecidas no Maranhão há muito tempo. O que está sendo denunciado agora, em esfera nacional, a oposição fala no Maranhão há quatro décadas. No Maranhão todo mundo sabe! E isso está sendo muito positivo porque a nação está conhecendo quem é o senador José Sarney. Isso é bom, muito produtivo.Por que produtivo?


VILLA: Sarney é o cacique que está há mais tempo na política brasileira, é extremamente nocivo. Toda essa crise que ele está vivendo me parece uma espécie de dobra de finados. A partir dali, acho que é a morte política do Sarney.


Ele está caminhando para essa morte política.Evidentemente, ele ainda tem um poderzinho, mas já não tem mais o mesmo poder que tinha.O que poderia significar essa morte política de Sarney?


VILLA: No Maranhão, Sarney deu um golpe de Estado com o auxílio do Tribunal Superior Eleitoral (sua filha Roseana assumiu o governo). É algo absurdo! Nunca vi isso. A derrubada de Jackson Lago é algo gravíssimo para a democracia brasileira. E houve um silêncio nacional. É bom lembrar que a presidente do Tribunal Regional Eleitoral do Maranhão (Nelma Sarney) é cunhada dele.E ele já tinha dado um golpe de Estado gravíssimo no Amapá.Teve a eleição do João Capiberibe (PSB-AP), e por compra de dois votos a R$ 24 cada um. Um escândalo. Isso mostra que ele tem muita força política no centro do poder. Mas, com a crise de agora, essa força diminuiu sensivelmente.Acho muito positivo porque um dos obstáculos para a plena consolidação da democracia brasileira é o poder coronelístico.


E o símbolo maior desse poder é Sarney.Para o senhor, Sarney é o grande coronel do Brasil?


VILLA: Sarney é o símbolo maior desse poder dos coronéis.Por isso essa crise é extremamente saudável. Estamos caminhando para virar a página, para o fim desse poder antidemocrático representado pelos oligarcas.E o maior deles é Sarney.


Qual a dimensão dessa crise atual do Senado?


VILLA: É certamente a maior crise da história do Senado.Sinceramente, desde 1890, na primeira eleição da República, quando foi criado o Senado republicano, não me lembro de outra crise tão grave e tão longa como esta que estamos vivendo.


É gravíssimo ter uma Casa onde a direção política era dada por um funcionário, o diretor-geral. É o único Senado do mundo ocidental em que a direção política é dada por um funcionário.O Senado brasileiro é uma “casa de horrores”, como definiu a revista britânica “The Economist”?


VILLA: Infelizmente, é triste, mas verdadeiro. É uma casa de horrores, mesmo! A nomeação de Paulo Duque (PMDB-RJ) para presidir o Conselho de Ética é um escândalo. Imagine, é um suplente! O conserto pode ser dado pelo eleitor daqui a um ano, quando forem renovados dois terços do Senado.


Para o senhor, só o eleitor pode mudar o Senado?


VILLA: Se não acreditarmos nisso, não há saída. A única saída é que o eleitor tenha consciência.E o eleitor de todos os estados. A gente, normalmente, imputa ao eleitor dos estados mais atrasados eleger qualquer senador. Mas São Paulo, por exemplo, tem um senador que está fazendo papel pífio nesta situação, que é o Aloizio Mercadante. O outro, Romeu Tuma, que é o corregedor, é omisso. E veja o caso de Minas Gerais, que tem um suplente, o Wellington Salgado, exercendo a senatoria há quatro anos…


O senhor disse que a Justiça tem sido omissa em relação às denúncias no Senado.


VILLA: Essas denúncias são gravíssimas. A cada dia tem uma, duas, três… Aí é papel da Justiça. Mas a grande questão é que a Justiça é omissa. Foram crimes gravíssimos cometidos no Senado, e com a absoluta omissão da Justiça.

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